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quinta-feira, 23 de abril de 2015

A origem mutante da tolerância à lactose

Você já deve ter ouvido falar dos X-Men. Eles são personagens de histórias em quadrinhos que têm super-poderes graças a mutações no DNA. Você acha que existem mutantes entre nós ou isso coisa de ficção?


Nessa matéria, vamos falar sobre a história evolutiva de uma mutação que surgiu em humanos há muitos anos e que foi essencial para a apreciação de maravilhas como a enorme variedade de queijos, o doce de leite e o chocolate.

É comum conhecermos pessoas que dizem não poder tomar leite ou iogurte, que são intolerantes à lactose, mas quando eram crianças não tinham esse problema. Isso é normal? Na verdade, esse é o cenário mais comum quando se considera os mamíferos como um todo: tomar leite materno logo ao nascer e mudar para uma dieta sem leite conforme crescem. Nós, humanos, somos exceções que conseguimos aproveitar o leite até na fase adulta. Vamos ver como isso aconteceu.

O leite e seus derivados contêm um tipo de açúcar chamado lactose e a lactase é a enzima responsável por digerir esse açúcar. Normalmente, as pessoas, assim como todos os outros mamíferos, conseguem digerir bem e obter energia da lactose desde que nascem até o fim da fase de amamentação. Apesar da maioria dos mamíferos diminuir e até encerrar a produção dessa enzima lactase quando deixam de depender do leite materno, atualmente cerca de 35% dos humanos adultos ainda são capazes de digerir lactose. Saiba mais sobre essa pesquisa aqui [1].

Ao longo da história evolutiva surgiram mutações em humanos que fizeram com que a lactase fosse produzida por mais tempo e, em alguns casos, até o final da vida. Essa mutação parece estar associada à prática do pastoreio, mas existem duas hipóteses que explicam como se dá essa associação. A primeira hipótese diz que a mutação surgiu e se espalhou em um grupo de pessoas por acaso, mas por terem a mutação, com o tempo começaram a consumir mais leite. A outra hipótese diz que a população de pastores já consumia leite e como a mutação conferia uma vantagem, essa característica se espalhou, assim como acontece em diversos casos de seleção natural. Estudos arqueológicos apoiam a segunda hipótese. Arqueólogos estudaram objetos de cerâmica com resíduos orgânicos que indicam o uso de leite há cerca de 8,5 mil anos no oeste da Turquia. Neste local, ainda hoje a mutação que faz a lactase ser produzida até a idade adulta é rara, o que indica que animais domésticos eram ordenhados mesmo que a mutação não estivesse presente. Veja mais aqui [2]. Existem evidências de que outras mutações com o mesmo resultado (produção de lactase em adultos) surgiram independentemente em outros continentes, como a África, por exemplo. Um estudo do DNA de pessoas da Tanzânia, do Kênia e do Sudão mostrou que três mutações diferentes resultaram no aumento da frequência da tolerância a lactose nessas populações nos últimos 7 mil anos [3].

Para maioria das pessoas é difícil imaginar a seleção natural atuando em humanos, mas há milhares de anos, quando não existiam supermercados, geladeira e suplementos alimentares, ter uma fonte de calorias constante era uma grande vantagem evolutiva. Por exemplo, quando ocorriam secas e a produção de grão era baixa ou entre os períodos de colheita, muitas pessoas poderiam não ter alimento suficiente para sobreviver ou para sustentar mais filhos. Se houvesse uma fonte de energia, como o leite, a falta de alimentos poderia ser um problema menor. Além disso, o leite também é uma fonte de cálcio muito importante, especialmente para pessoas que vivem em locais com pouca incidência de sol, o que acontece no norte da Europa, onde a mutação ocorre com uma frequência muito alta (89 a 96%).

Ainda há muito o que estudar para compreendermos os processos evolutivos que nos trouxeram até o que somos hoje. A genética e a arqueologia são duas áreas do conhecimento que podem nos levar a descobrir nossa história e existem ainda muitas outras. Leia aqui mais detalhes sobre esses estudos. [4]

Então, você é um mutante?

Existem outras mutações importantes que surgiram relativamente há pouco tempo nos humanos, como a que torna pessoas imunes ao vírus da AIDS. Vamos falar delas em outras publicações! Acompanhe!


Referências
[1] Ingram, C. J., Mulcare, C. A., Itan, Y., Thomas, M. G., & Swallow, D. M. (2009). Lactose digestion and the evolutionary genetics of lactase persistence. Human genetics, 124(6), 579-591.

[2] Evershed, R. P., Payne, S., Sherratt, A. G., Copley, M. S., Coolidge, J., Urem-Kotsu, D., ... & Burton, M. M. (2008). Earliest date for milk use in the Near East and southeastern Europe linked to cattle herding. Nature, 455(7212), 528-531.


[3] Tishkoff, S. A., Reed, F. A., Ranciaro, A., Voight, B. F., Babbitt, C. C., Silverman, J. S., ... & Deloukas, P. (2007). Convergent adaptation of human lactase persistence in Africa and Europe. Nature genetics, 39(1), 31-40.

[4] Gerbault, P., Liebert, A., Itan, Y., Powell, A., Currat, M., Burger, J., ... & Thomas, M. G. (2011). Evolution of lactase persistence: an example of human niche construction. Philosophical Transactions of the Royal Society B: Biological Sciences, 366(1566), 863-877.
http://rstb.royalsocietypublishing.org/content/366/1566/863.full

[5] http://news.sciencemag.org/archaeology/2015/04/how-europeans-evolved-white-skin


por Patricia Sanae Sujii
sujiips@gmail.com

sexta-feira, 20 de março de 2015

Alimentação Saudável x Alimentação Sustentável: Qual a diferença?

Quem nunca ouviu falar que é preciso ter uma alimentação saudável para ter uma melhor qualidade de vida? Ou que comer gordura e fritura não faz bem para a sua saúde? Tudo isso é verdade, alimentar-se bem, de forma equilibrada, é fundamental para ter uma vida mais saudável e longínqua. Por outro lado, cada vez mais se fala em sustentabilidade, em como agir de maneira economicamente e ambientalmente viável para que possamos viver em um mundo melhor. Mas é possível juntar esses conceitos? Será que é possível tem uma alimentação ao mesmo tempo saudável e sustentável? Como isso seria?

Figura 1. Varejão 2 AMIGOS localizado na cidade de Piracicaba/SP. (Foto: Julia Savieto) 
 Vamos pensar em exemplos práticos, como um prato de comida tipicamente brasileiro com arroz, feijão, farofa, carne, salada de alface e tomate. Parece um prato saudável não? Agora vamos pensar como esse prato chega à nossa mesa, aqui em Piracicaba, no interior do Estado de São Paulo. Vamos pensar no arroz, imagine que esse grão é produzido no Estado de Mato Grosso e transportado por rodovias por aproximadamente 1.200 km; e do feijão, vamos supor que ele é produzindo no Paraná e transportado por 700 km em rodovia. Vamos nos ater apenas a esses dois grãos, para ele chegar até a nossa mesa aqui em Piracicaba eles viajaram, juntos, quase 2.000km em rodovias, utilizando combustíveis fósseis e embalagem. Então você acredita que esse prato pode ser considerado sustentável?  
Não estou falando para deixarmos de comer arroz e feijão, longe disso! Estou tentando mostrar a dificuldade de conseguirmos juntar dois conceitos tão importantes como a alimentação saudável e a sustentabilidade. Aplicar esses conceitos em nossa vida é ainda mais complicado, já que é preciso encontrar um equilíbrio entre eles, sem que haja um favorecimento de um em detrimento do outro. Parece que estamos em uma encruzilhada, ou escolhemos uma alimentação mais saudável independente das consequências ambientais por traz deles, ou escolhemos uma alimentação composta de produtos com menor impacto no ambiente, independente das propriedades nutritivas deles.
Parece algo complicado, e acredito que muitos de vocês leitores nunca param para pensar nisso. Eu confesso que também não tinha parado para refletir até uns cinco meses atrás, durante uma aula de faculdade da disciplina de Sistemas de Produção ministrada pelo Prof. Dr. Carlos Armenio Khatounian da ESALQ/USP. Esse assunto realmente chamou tanta minha atenção que decidi compartilhar com vocês. As soluções apontadas pelo Prof. Armênio foram tão plausíveis que merecem ser ouvidas e repassadas. É claro que não há uma receita de bolo, que as práticas propostas por ele não são revolucionárias, mas são pequenas atitudes que podemos tomar para ter uma vida mais saudável sem prejudicar o nosso planeta.
Vamos as soluções práticas, então o que podemos fazer? As respostas são tão simples que nos fazem realmente pensar que sim, é possível ter uma alimentação saudável e sustentável. Segundo o Professor Armênio, pequenos cuidados do dia a dia já são suficientes para melhorarmos essa situação, como tentar dar preferência para o consumo de frutas e verduras da época, preferir alimentos orgânicos ou com menor quantidade insumos agrícolas e por que não começar uma horta em casa? Não é preciso muito espaço e podem ser bem simples, seria a produção de sua comida na sua própria casa, fantástico! Pensando um pouco no lado econômico, a escolha de produtos produzidos em sua região, também pode favorecer a economia local e beneficiar sua região como um todo.
Essas são apenas algumas das práticas que podemos adotar no nosso dia para ser possível ter uma boa alimentação de forma “ecologicamente correta”. Não é preciso nada muito drástico, apenas prestar um pouco mais de atenção nas suas atitudes, para benefício próprio e de toda a comunidade. O que temos a perder? Nada, só temos a ganhar uma vida melhor em um planeta melhor! Que tal tentar prestar atenção a próxima vez que for ao mercado, feira, varejão? Você vai ver que realmente faz a diferença!

Por Nathalia Brancalleão
e-mail para contato: na_brancalleao@hotmail.com


Referências bibliográficas:

Aula “Alimentação Saudável x Sustentável” ministrada pelo Prof. Dr. Carlos Armenio Khatounian do Departamento de Produção Vegetal na ESALQ/USP.

KHATOUNIAN, C. A.; Soares Jr, D. Abordagem sistêmica e pesquisa participativa na agricultura familiar: ferramentas para o desenvolvimento. Informe Agropecuário, Belo Horizonte, v. 26, p. 17-27, 2005.

terça-feira, 4 de novembro de 2014

Alimentação e boa nutrição II

Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), a definição de nutrição é “a ingestão de alimentos, tendo em conta as necessidades alimentares do corpo. Uma boa nutrição - uma dieta adequada e equilibrada combinada com atividade física regular - é a ‘pedra fundamental’ de uma boa saúde. A má nutrição pode levar à redução da imunidade, aumento da suscetibilidade à doenças, prejudicando o desenvolvimento físico e mental e redução da produtividade” [1].

Pirâmide Alimentar (Fonte: http://www1.hu.usp.br/profissionais/nutricao/arquivos/Pir%C3%A2mide_adaptada_link.pdf)

Olhando para a pirâmide alimentar, vemos na base “arroz, pão, massa, batata e mandioca” que consistem em carboidratos. Logo mais acima vemos “verduras, legumes e frutas”, sendo que estes alimentos são responsáveis por nos fornecer vitaminas e minerais, fibras e energia para nós. Próximo aparecem as carnes e ovos, queijo, leite e iogurte, responsáveis pelo fornecimento de proteínas e alguns minerais, e também aparecem os feijões que contém proteínas, carboidratos e minerais. Lá no topo da pirâmide, aparecem os óleos e gorduras, que contém lipídeos importantes para nós, e o açúcar e doces, que também contém carboidratos.
Cada um desses nutrientes tem sua devida importância em nossa nutrição. Os carboidratos são importantes para nos fornecer energia para o dia-a-dia, sendo que o nosso sistema nervoso central, que coordena nossos movimentos, pensamentos, etc., funcionam exclusivamente de um carboidrato chamado glicose, açúcar de 6 carbonos. Já as proteínas tem função estrutural, como por exemplo constituição muscular e também são responsáveis por catalisar reações químicas importantes para a célula. Já os lipídeos têm, primariamente, função energética (para se ter uma ideia, chega a fornecer mais que o dobro de energia do que os carboidratos) porém também são precursores de hormônios no corpo. Por fim, as vitaminas e minerais são importantes para diversas funções químicas no metabolismo, sendo o primeiro considerado um biocatalizador – como é o caso da vitamina C, poderoso anti-oxidante –  e o segundo que estão envolvidos na regulação e manutenção de funções importantes do metabolismo.
As quantidades de porções definidas por cada grupo de alimento tem a ver com as nossas necessidades diárias. Valores diários recomendados (VDR)* de cada alimento para um adulto médio são:

Tabela 1 – VDR para um adulto médio
Energia
2.000 kcal
Proteínas
50 g
Hidratos de Carbono
270 g
Açúcares
90 g
Gordura
70 g
Gorduras Saturadas
20 g
Fibra
25 g
Sódio (sal)
2,4 g


Veja a sugestão de um cardápio bem balanceado, considerando esses valores, clique: Artigo de Phillip et al. (1999) [2].
E você, segue uma dieta bem balanceada? Não come as porções recomendadas de frutas, verduras e legumes? Ou não consegue resistir a um doce e uma picanha com aquela capinha de gordura? A preocupação com a alimentação é importante, mas até que ponto temos que nos privar, ou podemos aproveitas as delicias do dia-a-dia?

Por Maria Letícia Bonatelli
mlbonatelli@gmail.com

Quer saber mais?
VDR aparecem nos produtos que você compra no dia-a-dia, já reparou? Entre no link e entenda: http://www.anvisa.gov.br/alimentos/rotulos/guia_bolso.pdf

*Os valores podem sofrer alterações conforme a pessoa e seu estilo de vida.

Referências:
[1] http://www.who.int/topics/nutrition/en/ Consultado em 04/11/2014.

[2] Philippi, S. T., Latterza, A. R., Cruz, A. T. R., & Ribeiro, L. C. (1999). Pirâmide alimentar adaptada: guia para escolha dos alimentos Adapted food pyramid: a guide for a right food choice. Rev. Nutr, 12(1), 65-80.

quinta-feira, 30 de outubro de 2014

Alimentação e a boa nutrição

É fácil entender porque o tema alimentação é tão recorrente em nossas vidas. "Nós somos o que comemos" – quem nunca ouviu essa frase? Nós realmente somos o que comemos na medida em que a nossa alimentação tem o potencial de proporcionar benefícios (ou malefícios) para a nossa saúde. Quem, hoje em dia, consegue se manter alheio à preocupação estética; preocupação sobre a nutrição; sobre os alimentos que, num dia são considerados ‘mocinhose no outro, ‘vilões? Se você faz parte desse mundo, tanto quanto eu, tenho certeza de que muitos questionamentos sobre alimentação já passaram por a sua cabeça.
Nossos parentes pré-históricos, há cerca de 3,5 milhões de anos atrás, já andavam em dois pés (ao contrário dos nossos parentes primatas), o que nos possibilitou ter as mãos livres para ir em busca de alimentos. Este fato também nos permitiu desenvolver diferentes tipos de armas, o que nos transformou de animais coletores a animais caçadores/coletores. Outros dois eventos foram de grande importância para o nosso desenvolvimento: o domínio do fogo, por volta de 250 mil de anos atrás e o desenvolvimento da agricultura de 10 a 12 mil anos atrás. Esses eventos combinados definiram o sistema de alimentação que utilizamos até hoje.
Nós somos animais onívoros, isso é, metabolizamos com eficiência tanto vegetais, grãos e cereais, como carne e derivados – salvo algumas exceções, como no caso de pessoas intolerantes à lactose. Porém, de maneira geral, uma alimentação balanceada conteria os diversos tipos de alimentos, respeitando às proporções desenvolvidas em 1992 por Susan Welsh e colaboradores e adaptada por Sonia Phillipi e colaboradores em 1999 para a realidade brasileira – estamos falando da pirâmide alimentar [1,2].

Pirâmide Alimentar (Fonte: http://www1.hu.usp.br/profissionais/nutricao/arquivos/Pir%C3%A2mide_adaptada_link.pdf)

Para entender a pirâmide devemos olhar da sua base (mais larga) para o seu ápice (mais estreito) e considerar essa a proporção dos alimentos que deveremos ingerir em um dia. Na base temos os carboidratos: arroz, pão, massa, batata e mandioca, sendo recomendado de 5-9 porções. Um pouco mais acima, encontramos frutas e hortaliças, variando de 3-5 porções diárias. Depois as proteínas: leite e derivados, carnes, ovos e leguminosas, que variam de 1-3 porções e, por fim, no pico da pirâmide temos óleos e gorduras, e açúcares e doces com recomendações de 1-2 porções diárias.
Essa proporção foi baseada em 7 pontos principais desenvolvida pela norte-americana Susan Welsh:
(1)  Ingestão de uma dieta variada em alimentos;
(2)  Manutenção do ‘peso ideal’;
(3)  Dieta pobre em gorduras, gorduras saturadas e colesterol;
(4)  Dieta rica em vegetais, frutas, grãos e produtos derivados dos grãos;
(5)  Açúcar com moderação;
(6)  Sal e sódio com moderação;
(7)  Bebidas alcoólicas com moderação.
Cada um dos pontos considerados visa promover a saúde global do indivíduo e a prevenção de doenças. Mas exatamente como isso acontece? Por que alguns alimentos são mais importantes que outros na pirâmide alimentar? São baseados nestes pontos que as dietas – mesmo as mais mirabolantes – são concebidas? Pra responder a essas e outras perguntas, acompanhe o texto da semana que vem!

Por Maria Letícia Bonatelli
mlbonatelli@gmail.com
Referências:
[1] Welsh, Susan, Carole Davis, and Anne Shaw. (1992). "Development of the food guide pyramid." Nutr Today 27(6):12-23.
[2] Philippi, S. T., Latterza, A. R., Cruz, A. T. R., & Ribeiro, L. C. (1999). Pirâmide alimentar adaptada: guia para escolha dos alimentos adapted food pyramid: a guide for a right food choice. Rev. Nutr, 12(1), 65-80.
[3] Figura acessada em 30/10/2014:(http://www1.hu.usp.br/profissionais/nutricao/arquivos/Pir%C3%A2mide_adaptada_link.pdf)