quinta-feira, 30 de outubro de 2014

Alimentação e a boa nutrição

É fácil entender porque o tema alimentação é tão recorrente em nossas vidas. "Nós somos o que comemos" – quem nunca ouviu essa frase? Nós realmente somos o que comemos na medida em que a nossa alimentação tem o potencial de proporcionar benefícios (ou malefícios) para a nossa saúde. Quem, hoje em dia, consegue se manter alheio à preocupação estética; preocupação sobre a nutrição; sobre os alimentos que, num dia são considerados ‘mocinhose no outro, ‘vilões? Se você faz parte desse mundo, tanto quanto eu, tenho certeza de que muitos questionamentos sobre alimentação já passaram por a sua cabeça.
Nossos parentes pré-históricos, há cerca de 3,5 milhões de anos atrás, já andavam em dois pés (ao contrário dos nossos parentes primatas), o que nos possibilitou ter as mãos livres para ir em busca de alimentos. Este fato também nos permitiu desenvolver diferentes tipos de armas, o que nos transformou de animais coletores a animais caçadores/coletores. Outros dois eventos foram de grande importância para o nosso desenvolvimento: o domínio do fogo, por volta de 250 mil de anos atrás e o desenvolvimento da agricultura de 10 a 12 mil anos atrás. Esses eventos combinados definiram o sistema de alimentação que utilizamos até hoje.
Nós somos animais onívoros, isso é, metabolizamos com eficiência tanto vegetais, grãos e cereais, como carne e derivados – salvo algumas exceções, como no caso de pessoas intolerantes à lactose. Porém, de maneira geral, uma alimentação balanceada conteria os diversos tipos de alimentos, respeitando às proporções desenvolvidas em 1992 por Susan Welsh e colaboradores e adaptada por Sonia Phillipi e colaboradores em 1999 para a realidade brasileira – estamos falando da pirâmide alimentar [1,2].

Pirâmide Alimentar (Fonte: http://www1.hu.usp.br/profissionais/nutricao/arquivos/Pir%C3%A2mide_adaptada_link.pdf)

Para entender a pirâmide devemos olhar da sua base (mais larga) para o seu ápice (mais estreito) e considerar essa a proporção dos alimentos que deveremos ingerir em um dia. Na base temos os carboidratos: arroz, pão, massa, batata e mandioca, sendo recomendado de 5-9 porções. Um pouco mais acima, encontramos frutas e hortaliças, variando de 3-5 porções diárias. Depois as proteínas: leite e derivados, carnes, ovos e leguminosas, que variam de 1-3 porções e, por fim, no pico da pirâmide temos óleos e gorduras, e açúcares e doces com recomendações de 1-2 porções diárias.
Essa proporção foi baseada em 7 pontos principais desenvolvida pela norte-americana Susan Welsh:
(1)  Ingestão de uma dieta variada em alimentos;
(2)  Manutenção do ‘peso ideal’;
(3)  Dieta pobre em gorduras, gorduras saturadas e colesterol;
(4)  Dieta rica em vegetais, frutas, grãos e produtos derivados dos grãos;
(5)  Açúcar com moderação;
(6)  Sal e sódio com moderação;
(7)  Bebidas alcoólicas com moderação.
Cada um dos pontos considerados visa promover a saúde global do indivíduo e a prevenção de doenças. Mas exatamente como isso acontece? Por que alguns alimentos são mais importantes que outros na pirâmide alimentar? São baseados nestes pontos que as dietas – mesmo as mais mirabolantes – são concebidas? Pra responder a essas e outras perguntas, acompanhe o texto da semana que vem!

Por Maria Letícia Bonatelli
mlbonatelli@gmail.com
Referências:
[1] Welsh, Susan, Carole Davis, and Anne Shaw. (1992). "Development of the food guide pyramid." Nutr Today 27(6):12-23.
[2] Philippi, S. T., Latterza, A. R., Cruz, A. T. R., & Ribeiro, L. C. (1999). Pirâmide alimentar adaptada: guia para escolha dos alimentos adapted food pyramid: a guide for a right food choice. Rev. Nutr, 12(1), 65-80.
[3] Figura acessada em 30/10/2014:(http://www1.hu.usp.br/profissionais/nutricao/arquivos/Pir%C3%A2mide_adaptada_link.pdf)

quinta-feira, 23 de outubro de 2014

A genética e a Restauração Florestal

Mudas de araribá em um viveiro de espécies 
nativas da Mata Atlântica.
   A restauração florestal é o processo de recuperação de um ecossistema que foi degradado ou destruído [1]. Atualmente, existem vários projetos de restauração e o número vem crescendo a cada ano. A estimativa de investimentos na restauração florestal ao redor do planeta é de 2 trilhões de dólares por ano, com uma meta de alcançar a recuperação de 150 milhões de hectares (equivalente ao tamanho do estados do Amazonas) até 2020 [2,3].

  A recuperação das florestas é uma prática considerada importante tanto por cientistas como pela população. (Leia mais aqui) Entretanto, o que nem todos sabem é que para restaurar uma floresta não adianta apenas plantar qualquer tipo de árvore, de qualquer jeito. Um exemplo de erro comum da década de 80, era plantar mudas de apenas poucas espécies pioneiras (com crescimento rápido e que toleram bem muito sol e menos água). A princípio parece uma idéia boa, porque obtém-se um resultado rápido. Entretanto, normalmente essas plantas têm naturalmente uma vida curta e não toleram ambientes mais sombreados, como é uma mata mais madura. Então, após 10 a 15 anos, a maioria das plantas morre e não há regeneração (Leia mais aqui)[6].

   Existem vários pesquisadores que estudam qual a melhor maneira de realizar uma restauração florestal para que as florestas possam se manter saudáveis a longo prazo. Eles consideram quais espécies devem compor a mata, como atrair animais e usam até ferramentas de genética para esse fim (saiba mais lendo o Box abaixo). Conhecendo essas informações, eles podem criar planos de restauração que necessitem de menos ações de manejo (plantar mais mudar, podar trepadeiras, etc.) ao longo dos anos e que permitam obter uma floresta que se sustente por muito tempo.

Box. Como a genética ajuda na restauração florestal 
Onde coletar sementes para restauração?
É importante compreender do quão diferentes são os organismos de cada local. Por exemplo, é possível identificar se as plantas de uma mata de onde se coleta sementes são diferentes das plantas de outra mata. Com as novas técnicas de estudo da genética dos organismos, são geradas informações que permitem identificar locais bons para coletar sementes para cada área de restauração de forma a evitar problemas de adaptação ao local de plantio. Também é possível identificar fontes de sementes que possam responder às mudanças climáticas, utilizando projeções futuras do clima [4].


2. Como plantar as mudas? 
É possível analisar como as plantas de uma área se relacionam, ou seja, se existe uma estrutura familiar entre indivíduos próximos. Isso permite planejar de forma mais adequada como distribuir as mudas ao longo da área de restauração [5].

    Apenas alguns municípios no país possuem viveiros de mudas de espécies nativas locais, então para realizar a restauração florestal onde não há um viveiro é necessário importar mudas de outras regiões. Uma dificuldade é que que, às vezes, o local de onde as sementes vêm não possui o mesmo clima ou o mesmo tipo de vegetação que a área onde as mudas serão plantadas. Informações genéticas podem nos ajudar a compreender se as plantas de onde são obtidas as sementes para restauração são adaptadas ao ambiente onde as mudas serão plantadas. Além disso, essas informações também permitem medir a capacidade das mudas formarem populações estáveis ao longo do tempo.

    Há mais de 20 anos, métodos de estudo da genética de plantas, animais e micro-organismos vêm sendo usados para subsidiar a recuperação de florestas. As novas técnicas de leitura das sequências de DNA permitem obter o genoma completo de um organismo em semanas, diferentemente das técnicas mais antigas que exigiam anos para obtenção dessa informação. Também é possível analisar milhares de pontos do DNA de centenas de indivíduos simultaneamente. Antigamente, só era possível obter tamanha quantidade de informação de espécies chamadas modelo por serem muito estudadas, como no caso dos humanos (nos quais se investe muito dinheiro) e da Arabidopsis thaliana, uma plantinha da família da couve (que é um organismo mais simples). Com essas novas técnicas, é possível estudar espécies nativas, sem muito conhecimento prévio, com custo muito reduzido. 

Desafios
    Um dos principais desafios do uso da genética para restauração é compreender a grande complexidade do genoma de algumas espécies. Essa complexidade é gerada naturalmente ao longo da história evolutiva de algumas espécies. Outro desafio é a capacidade limitada de processamento de dados. As novas tecnologias de geração de informações genéticas produzem quantidades enormes de dados. Essas análises demandam tempo, grande capacidade computacional e profissionais capacitados. Também é necessário compreender melhor como os dados obtidos se encaixam nas teoria existentes, para tirar conclusões seguras. Esses estudos estão sendo desenvolvidos continuamente nas mais diversas instituições de pesquisa espalhadas pelo mundo (Descubra mais sobre elas aqui) [7].     


Patricia Sanae Sujii
Fale com a pesquisadora: sujiips@gmail.com

Referências: 
[1] Society for Ecological Restoration (2004) SER International Primer on Ecological Restoration, Society for Ecological Restoration
[2] Cunningham,S.(2008) ReWealth!: StakeYour Claimin the $ 2 Trillion Development Trend That’s Renewing the World. McGraw-Hill
[3] International Union for Conservation of Nature (IUCN)
[4] Byrne, M. et al. (2013) Adaptation to Climate in Widespread Eucalypt Species, National Climate Change Adaptation Research Facility
[5] Mosner, E. et al. (2012) Floodplain willows in fragmented river landscapes: understanding spatio-temporal genetic patterns as basis for restoration plantings. Biol. Conserv. 153, 211–218
[6] Rodrigues, R. R., Lima, R. A., Gandolfi, S., & Nave, A. G. (2009). On the restoration of high diversity forests: 30 years of experience in the Brazilian Atlantic Forest. Biological Conservation, 142(6), 1242-1251.

[7] Williams, A. V. et al. (2014) Next generation restoration genetics: applic’tions and opportunities. Trends in Plant Science. in press.

quinta-feira, 16 de outubro de 2014

Florestas são importantes "apenas" para evitar racionamento?

Reservatório municipal de água de Iracemápolis antes e depois da restauração. 
(Fonte: Brancalion e colaboradores[1])

    Diariamente, ouvimos falar que os reservatórios de água do estado de São Paulo estão com níveis muito abaixo do normal. Existem cidades que já enfrentam até racionamento de água. É claro que a falta de chuvas anormal do último verão é um fator muito importante para isso, mas existe uma cidade no interior de São Paulo chamada Iracemápolis, muito próxima a Piracicaba e Rio Claro, que recebeu a mesma quantidade de chuvas e não tem risco de racionamento. Você deve estar se perguntando como isso é possível.
    No início da década de 1980, o reservatório de água de Iracemápolis estava com níveis baixos graças ao acúmulo de sedimentos em seu leito (assoreamento) causado pela erosão dos terrenos ao seu redor, que eram cobertos por plantações de cana-de-açúcar. Para resolver o problema, drenaram o reservatório e elevaram a altura da barragem. Além disso, para evitar futuros problemas similares, foi criado um cinturão de mata ao redor do reservatório (mata ciliar) para proteger as margens, o solo e as nascentes ali presentes. Este plantio de árvores em uma área degradada é chamado de restauração florestal.
    A restauração florestal é reconhecida por pesquisadores como uma das soluções para problemas ambientais relacionados tanto à biodiversidade como à proteção do solo e da água. Porém, o que a população em geral percebe como benefícios de restaurar matas? Um trabalho realizado no município de Iracemápolis (SP) mostrou algumas das respostas para essa pergunta.
    Aproximadamente 22 anos depois, uma pesquisa revelou o que os moradores de Iracemápolis percebem como benefícios da restauração da mata ao redor do reservatório de água municipal. O principal benefício indicado foi uma melhora na quantidade e na qualidade da água disponível. A maioria das pessoas (76%) lembra-se do período de grave escassez de água que ocorreu no passado e que não se repetiu depois da restauração da mata ao redor da represa. Muitos entrevistados (65%) afirmaram que poderiam até pagar impostos extras associados à conta de água, mas só se esse dinheiro fosse investido na restauração florestal no município. Dentre outros benefícios reconhecidos, destaca-se ter uma opção de local para recreação, já que a mata é visitada por pescadores, ciclistas e pessoas que gostam de fazer trilhas. Outros benefícios reconhecidos foram educacional (12%), com visitas de estudantes de diversos níveis de ensino; proteção da biodiversidade (12%); proteção do solo contra erosão (10%), entre outros.








Reservatório municipal de água de Iracemápolis
 em maio de 2014.
    É importante conhecer melhor quais desses benefícios são reconhecidos pela sociedade, pois isso pode ajudar a convencer tomadores de decisão da importância da restauração florestal. Esse conhecimento também pode ser útil para pesquisadores e entidades de proteção ao meio ambiente que desejam obter recursos para futuros projetos. Além disso, compreender essa percepção da população local é muito importante para o desenvolvimento e a implementação de novos projetos de lei, de modo que os problemas ambientais sejam sanados, sem deixar de atender as necessidades da sociedade.
    Agora conhecemos melhor a importância de se restaurar florestas. Na minha próxima matéria, falarei um pouco sobre como usamos informações genéticas para ajudar na restauração florestal.

Por Patricia Sanae Sujii
sujiips@gmail.com

Referência: 
[1] Brancalion PHS, Cardozo IV, Camatta A, Aronson J, Rodrigues RR. 2014. Cultural Ecosystem Services and Popular Perceptions of the Benefits of an Ecological Restoration Project
in the Brazilian Atlantic Forest. Restoration Ecology, 22(1): 65–71.

quinta-feira, 9 de outubro de 2014

A “Nova era da genética” e os Estudos Mitocondriais


Figura 1 - Genoma mitocondrial de P.psidii.
Hoje estamos vivendo na “Nova Era da Genética”, onde as informações obtive através de técnicas moleculares vêm sendo complementadas cada vez mais com a utilização de ferramentas bioinformáticas.
Um exemplo da necessidade dessas ferramentas são os sequenciadores de última geração. Os sequenciadores de DNA são equipamentos que tem a capacidade de realizar a leitura de uma amostra de DNA e gerar um arquivo eletrônico com símbolos, que representam a sequência de bases nitrogenadas (aquelas letrinhas A, C, G, T) contidas na amostra. A grande diferença entre o primeiro método de sequenciamento (Sanger) e os da nova geração é a capacidade de processar sequências, enquanto o primeiro processa no máximo 96, os novos podem ler até bilhões ao mesmo tempo. Alguns exemplos de sequenciadores modernos são: 454 (Life Science /Roche), HiSeq e Miseq (Ilumina), SOLiD (Life Tecnologies), HeliScope, SMRT (Pacific Bioscience), entre outros.
Esse grande processamento de sequências gera muitas informações que precisam ser interpretadas com a ajuda de programas computacionais - mais conhecidos como programas de bioinformática. Dois exemplos são o CLC genomics (http://www.clcbio.com/products/clc-genomics-workbench/) e o Mauve Genome alignment (http://gel.ahabs.wisc.edu/mauve/) que tem a capacidade de ordenar os dados gerados, e de realizar análises comparativas, entre outras funções. A partir destes dados, adquirimos muitas informações sobre o genoma (ou DNA) que estamos estudando. Neste caso, informações relevantes que podem ser geradas são proteínas relacionadas ao processo de respiração celular e genes relacionados à patogenicidade.
Um genoma que vem ganhando bastante espaço nas pesquisas hoje é o mitocondrial, principalmente em estudos que buscam medidas alternativas aos pesticidas para o controle de fungos que causam doenças em plantas. No genoma mitocondrial podem estar presentes proteínas que ajudam o fungo a infectar a planta, como também alterações em lugares específicos dessa sequência podem ajudar ou prejudicar a ação do fungo.
Estamos falando do genoma mitocondrial, DNA circular que esta dentro de uma organela, a Mitocôndria, cuja função é a respiração celular. Assim, alterações neste DNA também podem causar deficiências neste processo, podendo levar os fungos à morte.
  
Figura 2: À esquerda plantas de eucalipto sadias. No lado direito superior uma planta atacada pelo fungo P. psidii (ferrugem) e no lado direito inferior uma imagem do fungo P. psidii. (Fomte: Leite et al., 2012)

Falei um pouquinho do DNA mitocondrial e das ferramentas de bioinformática para explicar meu projeto de Iniciação científica. Eu estudo o genoma mitocondrial do fungo P. psidii, causador de uma das principais doenças que afetam a espécie, chamada de ferrugem do eucalipto, que pode chegar a reduzir em até 60% o crescimento das árvores infectadas.  O objetivo do meu estudo é obter a sequência completa deste genoma e buscar maiores informações sobre este fitopatógeno (fito – planta) que ainda é muito pouco estudado.


Por Jaqueline Almeida
jackalmeidajau@hotmail.com

Referências
[1] Dianese J. C, Moraes T. S. A., Silva A. R. (1984). Response of Eucalyptus Species to field infection by Puccinia psidii. Plant Disease, 68: 314-316.
[2] Leite, T. F. (2012). Análise histológica da interação planta patógeno entre Eucalyptus grandis e Puccinia psidii Winter e identificação de genes diferencialmente expressos em plantas resistentes e susceptíveis inoculadas com o patógeno por meio da técnica de RNA-Seq. 2012. 178p. Tese (Doutorado em Genética e Melhoramento de Plantas) – Escola Superior de Agricultura “Luíz de Queiroz”, Universidade de São Paulo, Piracicaba.

quinta-feira, 2 de outubro de 2014

Resistência dos patógenos da uva ao controle químico: como estudar esse fenômeno?

 Há um tempo, eu estava caminhando no meu bairro quando a minha mãe me disse: “Eles - referindo-se aos donos da casa - já passaram veneno no mato da calçada, mas ele sempre volta a crescer!” Pensei comigo: possivelmente a grama daquela calçada é resistente ao veneno e cresce mesmo após a sua aplicação. Crônicas do meu cotidiano à parte, não seria útil saber, antes de aplicá-lo, se a grama da calçada é resistente ou não ao veneno? É isso que tento responder no meu projeto de mestrado, mas em uma realidade um pouco diferente.
A uva, como grande parte das pessoas sabe, é uma das frutas que mais recebe aplicações de fungicidas e de outros defensivos agrícolas, como forma de controle químico das doenças. Os produtores têm receio de perder a produção por causa das diferentes doenças causadas por fungos e por isso utilizam o controle químico como forma de "prevenir e remediar" as doenças. Este exagero, além de poder prejudicar nossa saúde - pois alguns resíduos ficam nos frutos que vamos comer - pode fazer com que os fungos resistentes à ação dos fungicidas se “espalhem” pela plantação, tornando o controle químico ineficiente.
O interessante é que nós, cientistas, podemos saber se existem fungos em uma determinada população resistentes a um ou a outro fungicida, ajudando a propor métodos adequados de controle da doença. Uma dessas formas é investigar genes específicos relacionados à resistência. Na minha pesquisa de mestrado irei estudar, em 4 espécies de patógenos da uva (sendo três fungos) (Figura 1), um gene mitocondrial chamado cytB. Escolhi-o porque outros estudos já relacionaram mutações presentes neste gene com a ineficiência da aplicação do principal fungicida utilizado no combate das doenças.
De modo geral, o fungicida interfere no processo de respiração celular dos fungos,  impedindo uma parte do transporte de elétrons na mitocôndria, causando um déficit na produção de energia que precisam para viver, levando-os a morte. Mas, dentre os fungos podem existir aqueles que são resistentes ao fungicida, ou seja, que não morrem mesmo após a sua aplicação. As mutações que fazem com que isso ocorra, que estão relacionadas ao gene cytB, fazem com que a molécula do fungicida não consiga mais se ligar ao seu sítio alvo dentro das células do fungo, perdendo assim a sua funcionalidade. No Brasil não temos nenhum relato publicado de que esses patógenos de uva sejam resistentes ao fungicida, provavelmente pela escassez de pesquisas nessa área, mas o fenômeno pode sim acontecer no país. Por isso que irei estudar o gene cytB na busca de possíveis mutações que possam fazer com que o patógeno não seja mais sensível ao controle químico.
Como farei esse estudo do meu gene de interesse? Dentre todas as técnicas que existem hoje, podemos sequenciar o gene, ou seja, saber exatamente qual a ordem das bases nitrogenadas A, T, C e G nesse pedaço do DNA que corresponde ao gene. Além de sequenciar e estudar esse gene em busca das mutações que causam a resistência ao fungicida eu também faço experimentos no laboratório testando quais populações são ou não resistentes, colocando os fungos para crescer no meio de cultura com o fungicida. Os resultados desses experimentos casam com os outros que consigo estudando as sequências de DNA.
Figura 1 - Colletotrichum sp -  é um fungo patógeno da uva e é meu interesse de estudo (Foto de autoria própria – Moraes, 2014).

O objetivo do meu projeto, além de fazer esse estudo no gene cytB e buscar mutações que possam conferir resistência aos fungos é, a longo prazo, ajudar a propor aos produtores de uva medidas de controle adequadas às doenças e aos patógenos. O meu estudo é também parte de um grande projeto, com financiamento da FAPESP, que estuda a epidemiologia, os danos e o controle de doenças na uva.
Para mim todo esse conjunto é o que de melhor a ciência nos proporciona: poder ajudar as pessoas! Se os resultados e todo o conhecimento gerado por nós, pesquisadores, ficassem na gaveta e nos relatórios todo esforço seria pouco útil. O mais gratificante é poder apresentar esses resultados ajudando as pessoas e trazendo contribuições para a sociedade. E é isso que eu pretendo com meu mestrado, ajudar com minha pesquisa e me realizar como pesquisadora.
Se você, leitor, tem mais interesse no assunto aqui está um trabalho bem didático que inclusive usei como parte do meu projeto:
Além disso, também sinta-se a vontade para comentar em nossa página ou entrar em contato conosco!


Até a próxima!
Por Nathália de Moraes
nathalia.esalq.bio@gmail.com