quinta-feira, 4 de junho de 2015

O incrível mundo microbiano

    Nesta edição especial do blog, teremos um mês inteiro dedicado a assuntos relacionados à microbiologia e é com imenso prazer que iniciamos esse tópico explicando quem são os micro-organismos e sua atual classificação em relação aos demais seres vivos. A definição clássica micro-organismos era de organismos que só podem ser vistos ao microscópio. Nesta, incluem-se os vírus e organismos uni ou pluricelulares como as bactérias, os protozoários, as algas unicelulares, fungos e os ácaros. Entretanto com o avanço da ciência essa definição tem sido repensada.
 

Micro-organismos

     Por exemplo, você sabia que foi encontrada uma bactéria “gigante”, isso mesmo uma bactéria visível a olho nu que mede aproximadamente 0,2 a 0,7 mm. Essa espécie, Epulopiscium fishelsoni, vive em simbiose (relação de vantagem mútua) com peixe-cirurgião. Esse fato evidencia o quanto ainda há para explorar desse mundo microscópico (ou nem tão microscópico assim!) habitado pelos mais diversos e adaptados organismos do planeta.
 
     Estima-se que atualmente tenham sido descritas mais de 70.000 espécies de bactérias e fungos, os principais e mais bem estudados micro-organismos. Você acha bastante? Na verdade, estudos apontam que isso é menos de 1% das espécies existentes. A grande maioria dos micro-organismos ainda precisa ser descoberta. Isso se deve em partes pela limitação de estratégias de cultivo dos mesmos.
 
     Por apresentarem uma grande diversidade metabólica, os micro-organismos são capazes de viver em todos os ambientes até momento explorados, desde fossas abissais no fundo do oceano até as mais remotas geleiras polares. Isso diretamente reflete o enorme potencial de aplicação dos mesmo e sua atuação para a manutenção da biosfera. Muitos micro-organismos são vitais em ciclo biogeoquímicos, como do nitrogênio e do enxofre. Eles também são excelentes degradadores de matéria orgânica, bem como de compostos xenobióticos (como exemplo herbicidas) e são capazes de produzir os mais diversos compostos como plásticos biodegradáveis. A grande maioria dos antibióticos comerciais é proveniente de bactérias e fungos. Na verdade estima-se que somente 3% dos micro-organismos podem causar doenças. O restante pode ser inócuo ou benéfico ao homem, como exemplo disso temos o fungo Saccharomyces cerevisae responsável pela fermentação de bebidas alcoólicas, (cerveja, vinho, cachaça) e muitos outros.
 
     Atualmente, o grande desafio é a correta classificação e entendimento da biologia desses organismos. O conceito biológico de espécie - organismos são considerados da mesma espécie quando são capazes de cruzarem e deixarem descentes férteis - por exemplo, não se aplica aos micro-organismos. No caso das bacterias, organismos que são procariotos, ou seja, possuem células sem núcleo delimitado por membrana, a multiplicação celular ocorre por fissão binária e grande parte da sua variabilidade genética é fruto da transferência lateral de genes, ou seja, por processos alternativos ao sexo.
 
     O mesmo ocorre com as arquéias, outro grupo classificado como procariotos, recentemente descobertas e que são capazes de viver nas condições mais extremas possíveis: altas temperaturas, alta salinidade e pressão, entre outras. Este grupo é, na verdade, uma mistura de eucariotos e procariotos, onde toda sua maquinaria genética relacionada com a replicação, transcrição e tradução, são parecidas com a das células eucarióticas. Já genes relacionados ao metabolismo celular são parecidos com de bactérias. Uma loucura né? Além disso, para esse grupo de micro-organismo a diversidade genética ocorre por transferência horizontal de genes, ou seja, a variabilidade é fruto de combinações de genes de grupos próximos, não somente por ancestralidade como ocorre com a maioria dos seres vivos. Isso realmente dificulta e torna tão interessante a classificação desses seres vivos.
 
    Ainda pensando em representantes dos micro-organismos, muitos fungos não tem ciclo sexual, ou se multiplicam por meio do ciclo sexual e também assexual. Como classifica-los? Outro problema, muitos fungos por terem os dois tipos de ciclos, possuem dois nomes. Qual o correto? Até hoje os cientistas não entraram em um consenso. Isso sem descrever os vírus, que são considerados seres acelulares, possuem material genético próprio, mas são dependentes de outros seres para se multiplicar.
 
   De fato, os micro-organismos possuem uma grande importância para nós. Na década de 1970 eles foram vitais para o desenvolvimento das tecnologias designadas de Engenharia Genética ou Tecnologia do DNA Recombinante. Estas técnicas utilizam em uma ou outra etapa os micro-organismos ou seus genes, mesmo quando objetiva-se a transformação de plantas ou animais. Nas últimas décadas com a emergência e a solidificação das novas áreas das Ciências como as Ômicas, Biologia de Sistemas e Biologia Sintética, o uso de micro-organismos em estudos genéticos tomou proporções nunca antes imaginadas. Uma bactéria inteiramente desenvolvida em laboratório foi criada. Estamos imitando Deus? Assim, fica evidente que apesar de microscópicos, esses organismos são vitais para o desenvolvimento da vida como entendemos hoje e para o desenvolvimento de novas ferramentas de estudos.


por Maria Carolian Quecine 
mquecine@gmail.com

e Patricia S. Sujii
 sujiips@gmail.com
Referências
Tortora GJ, Funke BR, Case CL. Microbiologia. Artmed, Porto Alegre-RS. 2012. 934 pp. ISBN: 8536326069 9788536326061.
Melo IS, Valadares-Inglis MC, Nass LL, et al. Recursos genéticos & melhoramento: microrganismos. Jaguariúna: Embrapa Meio Ambiente. 2002.
Gerd HG. et al. Preparing synthetic biology for the world. Frontiers in Microbiology, v.4, artigo 5, 2013.
Gibson DG et al. Creation of a Bacterial Cell Controlled by a Chemically Synthesized Genome. Science 329, v. 52, 2010.


The amazing microbial world

      This whole month, we will have a special edition dedicated to subjects related to microbiology. It is with great pleasure that we start this topic explaining who are the micro-organisms and how they are classified in relation to other living beings. The classical definition of micro-organisms was “organisms that only can be seen at the microscope” in which are included viruses, and both unicellular and multicellular organisms such as bacterias, protozoa, unicellular algae, fungi and mites. However, this conception is being rethought with science progress. Did you know that scientist found a giant bacteria? It measures between 0.2 and 0.7 cm and it is possible to see it with the naked eye. This species is called Epulopiscium fishelsoni, and it lives in symbiosis (mutually beneficial relationship) with the surgeonfish. This highlights how much there is to explore in this microscopic (or not so microscopic) world inhabited by the most diverse and well adapted organisms in this planet.
 

Microbes
     We estimate that more than 70,000 species of bacteria and fungi have already been  discovered and described, which are the main and best studied micro-organisms. Do you think it is a lot? In fact, some studies indicate that these are less than 1% of existing species. The  vast majority of micro-organisms have yet to be discovered. This is, in part, due to the limitation of micro-organism growth techniques.
 
     Because of the great metabolic diversity observed in different species, micro-organisms are able to live in all environments explored so far, from abyssal trenches on the ocean floor to the most remote glaciers in the South and North Pole. This shows the enormous potential applications for humans and their roles in the biosphere maintenance. Many micro-organisms are essential in biogeochemical cycles, as in the nitrogen and the sulphur cycles. They are also excellent decomposers of organic material, as well as xenobiotic compounds (such as herbicides), and are able to produce the most diverse compounds, for example biodegradable plastics and most commercial antibiotics that come from bacterias or fungi. As matter of fact, it is estimated that only 3% of micro-organisms can cause diseases and all the others may both be innocuous or beneficial to humans. One example of this is the fungi Saccharomyces cerevisae, which is responsible for fermentation of alcoholic drinks as beer, wine and cachaça (a Brazilian strong drink).
 
     Now, one big challenge is the correct classification and understanding of these organisms biology. The biological species concept (species is a group of organisms potentially capable to breed and generate fertile descendants) does not apply to micro-organisms. Bacterias are prokaryote (organisms without a membrane around the nucleus) that reproduce by binary fission (cell division) and most of their genetic variability is consequence of lateral transfer of genes, which is different from sexual reproduction.
 
     The same is true for the archaeas, an other group classified as procaryotes recently discovered that are able to live in the most extreme conditions: high temperatures, high salinity, high pressure and others. In fact, this group is a mix of eucaryotes and procaryotes, because all genetic machinery responsible for cell replication, transcription and translation are similar to eucaryote cells. On the other hand, genes related to cell metabolism are more similar to bacterias (procaryotes). Crazy, isn’t it? Furthermore, in this group of organisms, the genetic diversity is transferred horizontally, i.e., the variability is a result of gene combinations in closely related groups, not only by ancestry as in most living being. This really complicates and makes the classification of these organisms so interesting.
Another example of micro-organisms is the fungi. Some of them do not have a sexual cycle, others have both sexual and asexual reproductive cycles. How can we classify them? Another problem is the fungi group that, having both cycles, were named twice. Which name should be the right one? So far, scientists could not reach a consensus. There are also viruses, which are considered acellular beings, have their own genetic material, but are dependent of other organisms to multiply.
 
     Indeed, microorganisms are very important for us. In the 1970s, they were essential to the development of technologies called genetic engineering or recombinant DNA technology. These techniques use micro-organisms or their genes in at least one step, aiming to transform other organisms as plants or animals. In the last decades, after the advent and establishment of new study areas such as the “Omics”, System Biology, and Synthetic Biology, the use of microorganisms in genetic studies reached proportions never thought before. For example, scientists developed a whole bacteria in the laboratory. Are we mimicking God? Thus, it is evident that although microscopic, these organisms are vital to the development of life as we understand it today and for the development of new tools for studies.


by Maria Carolian Quecine 
mquecine@gmail.com

and Patricia S. Sujii
 sujiips@gmail.com

english review by Emily Lachapelle

References
Tortora GJ, Funke BR, Case CL. Microbiologia. Artmed, Porto Alegre-RS. 2012. 934 pp. ISBN: 8536326069 9788536326061.
Melo IS, Valadares-Inglis MC, Nass LL, et al. Recursos genéticos & melhoramento: microrganismos. Jaguariúna: Embrapa Meio Ambiente. 2002.
Gerd HG. et al. Preparing synthetic biology for the world. Frontiers in Microbiology, v.4, artigo 5, 2013.
Gibson DG et al. Creation of a Bacterial Cell Controlled by a Chemically Synthesized Genome. Science 329, v. 52, 2010.

    

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