quinta-feira, 30 de abril de 2015

As células imortais de Henrietta Lacks

Em 1951 Henrietta Lacks, com apenas 31 anos, morreu de câncer cervical. Hoje, mais de 60 anos depois, suas células “imortais” ainda são usadas e são essenciais para a pesquisa na área médica. Como surgiram essas células imortais? Qual a sua importância para a pesquisa hoje em dia? As respostas você encontra nesse texto de hoje do blog.
Henrietta (imagem 1) era uma mulher pobre que trabalhava em uma fazenda de tabaco próxima à Baltimore, nos EUA; com 30 anos ela descobriu que estava com câncer cervical (também chamado câncer de cólo de útero). Durante um exame em um dos melhores hospitais dos EUA uma amostra de suas células tumorais foi retirada, sem o seu consentimento, e entregue a um pesquisador que há anos falhava na tentativa de conseguir células tumorais que crescessem fora do corpo humano, o que ajudaria no entendimento do câncer. O pesquisador então ficou surpreso, pois as células de Henrietta se propagavam rapidamente no laboratório, diferentemente de todas as outras que ele havia testado.
Foi assim que esse pesquisador George Gey conseguiu, no ano de 1951, cultivar a primeira linhagem imortal de células humanas que passaram a se chamar células HeLa – pela junção das duas primeiras letras do nome e sobrenome de Henrietta. Assim como espalhavam-se nas placas de laboratório, as células tumorais espalharam-se pelo corpo de Henrietta que em outubro de 1951 morreu em decorrência do câncer, sem saber que de seu corpo, sem autorização, foram retiradas as células usadas por Gey.
Deixando de lado questões éticas e de responsabilidade, as células HeLa se tornaram extremamente importantes para a medicina desde então. Elas são chamadas imortais pois podem crescer indefinidamente, podem ser congeladas, podem se dividir várias vezes e podem ser compartilhadas entre os pesquisadores. Além disso, são fáceis de serem usadas e cultivadas em laboratório.
As células HeLa (imagem 1) foram importantes não só para o entendimento do câncer mas para a criação da vacina da poliomielite em 1952, a descoberta da enzima telomerase humana, para a clonagem, para experimentos de expressão gênica e até para testes nucleares. Estimativas indicam que existem mais de 75 mil artigos no mundo com menção às células HeLa e que se todas essas fossem enfileiradas dariam pelo menos três voltas ao redor da Terra!


Imagem 1: Henrietta Lacks com seu marido1 (acima) e as células HeLa2, conseguidas através da retirada de células cancerosas de Henrietta (abaixo). 
Fonte (1) adaptado de http://www.smithsonianmag.com/science-nature/henrietta-lacks-immortal-cells-6421299/?no-ist e (2) "HeLa cells stained with Hoechst 33258" by TenOfAllTrades - From English wiki 1. Licensed under Public Domain via Wikimedia Commons- http://commons.wikimedia.org/wiki/File:HeLa_cells_stained_with_Hoechst_33258.jpg#/media/File:HeLa_cells_stained_with_Hoechst_33258.jpg

         Mas por que essas células são imortais? Vamos lembrar que durante a divisão celular os telômeros dos cromossomos (veja aqui) se encurtam, ou seja, se tornam menores, levando a célula a ficar senescente e morrer depois de sucessivas divisões. Os cientistas acreditam que uma atividade anormal da enzima telomerase nas células HeLa impeça o encurtamento dos telômeros e assim como todas as células tumorais faça com que não envelheçam.
Outras análises mostram ainda que as células Hela não possuem o mesmo número de cromossomos que as células humanas, o que cria novas hipóteses do motivo das células HeLa serem diferentes de outras cancerosas. Assim, são necessárias mais pesquisas, principalmente depois de o genoma dessas células ser completamente sequenciado em 2013 (acesse aqui).
Muitas décadas se passaram desde a morte de Henrietta, mas as células HeLa continuam “imortais” com seu papel muito importante para a medicina. Pode-se esperar que muitas descobertas ainda sejam feitas e muitas vidas salvas por causa de seu uso na pesquisa médica. Henrietta quando morreu não sabia que nos deixaria tamanho legado, por isso é tão importante mostrar para as pessoas o seu papel na ciência e especialmente na medicina humana.
Agora que você sabe sobre as células HeLa não deixe de visitar a página da sua Fundação “The Henrietta Lacks Foundation” e saiba mais sobre sua história e de seus familiares.
Dúvidas e comentários são sempre bem-vindos!
Até a próxima!

Por Nathália de Moraes
nathalia.esalq.bio@gmail.com

Referências bibliográficas

[1] Callway, E. (2013). Deal done over HeLa cell. Nature. 500: 132-133. Disponível em:
[2] Zielinski, S. (2010). Henrietta Lacks’ “Immortal” cell. Acessado de http://www.smithsonianmag.com/science-nature/henrietta-lacks-immortal-cells-6421299/?no-ist em março de 2013.
[3] Muotri, A. (2008). A dama imortal: HeLa para os íntimos. Acessado de http://g1.globo.com/platb/espiral/2008/04/25/a-dama-imortal-hela-para-os-intimos/ em março de 2013.
[4] Cozer, R. (2011). A eterna presença de Henrietta. Acessado de http://cultura.estadao.com.br/noticias/geral,a-eterna-presenca-de-henrietta,695205 em março de 2013.
[5] Skloot, R. (sem data). The imortal life of Henrietta Lacks. Disponível em: http://rebeccaskloot.com/wp-content/uploads/2011/03/HenriettaLacks_RGG_timeline.pdf
[6] Ivankovic et al. (2007). Telomerase activity in HeLa cervical carcinoma cell line proliferation. Biogerontology. 8: 163-172. Disponível em: http://download.springer.com/static/pdf/598/art%253A10.1007%252Fs10522-006-9043-9.pdf?auth66=1426190318_f416e7fa94124cc05d9f3acc6d76e778&ext=.pdf

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